O Acordo de Paris é menos do que o mundo precisa,
mas tem pontos positivos e dá um rumo global aos esforços que precisam
ser feitos. Perto do que tínhamos, é um avanço. Para o que precisamos,
ainda falta muito. “Este acordo não irá nos tirar do buraco onde
estamos, mas ajuda nossa escalada para fora dele”, disse o presidente mundial do Greenpeace, Kumi Naidoo.
O trabalho que o governo brasileiro tem pela frente
O Brasil teve um papel determinante na costura do acordo que saiu da
COP 21. Lideramos um dos grupos de negociações e, certamente, nossos
representantes ajudaram em muito para que o acordo ocorresse. De volta
para casa, porém, nossa atual trajetória ambiental e as promessas que o
Brasil enviou para a COP de Paris precisam de mudanças profundas.
O país, hoje, encontra-se claramente na contramão de alguns dos
pontos positivos do acordo. O reconhecimento dos direitos indígenas
talvez seja o mais visível deles. Enquanto nos fóruns da ONU eles ganham relevância e respeito, por aqui enfrentam uma tentativa diária e desumana de aniquilação. Não faltam exemplos vindos do Congresso, do Planalto e do dia a dia.
Nos corredores do poder em Brasília, parlamentares e o governo tentam
saquear suas terras, com projetos de mineração e hidrelétricas. A PEC 215,
projeto que muda a constituição, pode ser traduzido como o fim dos
direitos dessas populações. O atual governo é o que menos demarcou
terras indígenas, e o segundo pior no quesito áreas que conservam
florestas. Anualmente, os índices de violência e assassinatos dessas
populações batem infelizes recordes.
Outra lição de casa que
precisamos fazer imediatamente é rever a fraca e insuficiente promessa
que o país enviou à ONU antes da conferência se iniciar. Nela, o plano
de combate ao desmatamento, nosso maior causador de emissões,
simplesmente não existe. O governo afirma que vai cumprir a lei
florestal até o ano de 2030. Não parece sério. Cumprir a lei não é plano, é obrigação. E
é algo a ser feito imediatamente, e não daqui a uma década e meia. Além
disso, desmatamento não traz apenas danos ambientais, mas causa imensos
prejuízos econômicos e sociais. O mínimo que podemos aceitar é zerar o
desmatamento.
Na parte de energia, a contradição é ainda mais evidente. A conferência concordou que o mundo deve caminhar para o fim do uso dos combustíveis fósseis.
Por aqui, o plano do governo é de que, nos próximos 10 anos, 70% dos
investimentos na área de energia terão como destino fontes poluentes.
Somos
uma das nações com maior potencial para aproveitamento de fontes
limpas, mas enviamos à ONU um plano para que, daqui a 15 anos, tenhamos o
mesmo percentual de energia renovável de hoje. O compromisso do governo
quase não inclui a fonte solar – a mais abundante do país. Além de
baixar a conta de luz do cidadão, essa fonte de energia gera empregos e
garante segurança energética. Mas sua participação nos planos futuros do
país é quase nula.
Assim como preservar florestas, investir em energia limpa não é
apenas uma questão ambiental, ou um favor que fazemos para a contagem de
carbono na atmosfera. É uma grande oportunidade para a economia do
Brasil e para a vida dos brasileiros. É uma questão de lógica, e depende
apenas da vontade de nossos governantes. Esperamos que eles se inspirem
no texto que ajudaram a construir.
Por enquanto, o Acordo de Paris nos dá um sopro de esperança. Já a realidade, é uma tormenta de preocupações.
*Márcio Astrini é coordenador de Políticas Públicas e Pedro Telles é da Campanha de Clima e Energia do Greenpeace Brasil
Fonte: http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Blog/o-acordo-de-paris-e-as-lies-de-casa-para-o-br/blog/55110/ - acesso: 26-12-2015